Uma noite em Piódão | Diário de Viagem
Cheguei a Piódão pouco antes da meia-noite, entre ruas silenciosas e casas de xisto iluminadas pela luz amarela. A viagem começava ali e seria transformadora
Aldeia de Piódão, joia do xisto na Serra do Açor, preserva a arquitetura tradicional e o charme das encostas portuguesas. Crédito: Paulo Novais/Lusa.
Em minha primeira passagem por Lisboa a trabalho, lá pelos idos de antigamente, aluguei um carro para conhecer as famosas autoestradas de Portugal e visitar minha comadre Inês Garçoni, fera na gastronomia, mestranda na Universidade de Coimbra.
Sempre admirei a história da cidade, com sua instituição secular e a fama da alegria da estudantada nas ruas.
Inês e eu batemos perna em Braga, no castelo de Guimarães e no Porto. Ao entardecer, fuçando o Facebook, me deparei com uma foto de Piódão postada por um outro amigo jornalista, o George Vidor.
E lá estavam elas, as casinhas de xisto, empoleiradas na montanha, a me dizerem: como é que você pode voltar para o Brasil sem conhecer isso? Não poderia.

E não voltei. Deixei Inês no trem para Coimbra, e escurecia quando segui para Piódão.
Cheguei pouco antes da meia-noite, meio zonzo de tanto serpentear na serra do Açor. Só havia um barzinho aberto na praça e o atendente foi a única pessoa acordada que vi no lugar. Por sorte, ele tinha um estúdio para alugar.
Passei a noite ali, no silêncio absoluto. Da janela, só via a luz amarela fazendo poesia nas paredes de madeira das casas em frente.
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Raramente ouvia passos ou qualquer outro ruído. Acordei com as ruas úmidas do orvalho, e perambulei pelas ruas realmente me sentindo um andarilho da Idade Média.
Fiz fotos, bisbilhotei janelas, respirei o ar da montanha e tomei um café da manhã reforçado no único bar aberto – o mesmo -, perto da igreja branca. Ao pegar a estrada foi que me dei conta do perigo que tinha corrido na escuridão da subida da serra.

É que um dos defeitozinhos de nascença que tenho é vertigem, o desconforto com altura. A estrada é alta e estreita, sem proteção nas laterais, e tive de parar o carro algumas vezes, fingindo para mim mesmo que parava só para fotografar a paisagem.
Na verdade, precisava retomar fôlego e coragem para acelerar. Meu voo para o Rio sairia de Lisboa no início da tarde.
Sobrevivi, embarquei, e a aldeia de Piódão ficou viva na lembrança. Não sossego enquanto não voltar com mulher e filha. Não posso viver tudo isso sozinho.
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